O Ceará já produziu 170 mil toneladas de castanha de caju. Hoje, produz cerca de 80 mil. O Brasil, que já foi o primeiro do mundo, está hoje fora da lista dos 10 maiores.
Há 30 anos, a cajucultura do Ceará atraia a atenção dos grandes importadores norte-americanos e europeus, que vinham aqui, pessoalmente, para negociar a renovação de contratos com as várias indústrias locais de beneficiamento.
Naquela época, a safra brasileira anual de castanha de caju passava das 300 mil toneladas – das quais 170 mil toneladas produzidas no Ceará.
Hoje, a cajucultura cearense respira por aparelhos, sendo muito reduzida sua chance de sobrevivência. Por quê? – indaga a coluna, interessada em conhecer as causas que levaram essa atividade à UTI.
Quatro executivos e um empresário do setor industrial beneficiador da amêndoa do caju respondem:
“Por vários motivos, entre os quais a falta de financiamento para a substituição do cajueiro antigo pelo da variedade anão precoce; a carência de assistência técnica ao pequeno produtor, o que é feito por algumas indústrias; a falta de boas práticas agrícolas, desconhecidas nos campos de produção; e o desprezo que os governos federal e estadual dão ao setor”.
De protagonista do mercado mundial de castanha, o Brasil – o Ceará, principalmente – tornou-se mero espectador, sem mais influir junto aos importadores dos EUA e Europa.
Em 1990, quando chegava a ditar preços e condições de entrega do produto, a indústria cearense de castanha reuniu em Fortaleza os maiores players mundiais desse mercado, “num evento marcante da nossa importância”.
Neste ano de 2022, um importador do Canadá veio a Fortaleza e, diante do seu fornecedor cearense, emitiu o comentário e as perguntas abaixo:
“No mundo todo, as safras de castanha de caju estão crescendo de ano para ano em volume e velocidade, mas no Ceará elas só fazem cair na mesma proporção. O que está acontecendo? Como se explica isso?”
O grupo de pessoas com as quais este colunista se reuniu ontem para tratar da situação da cajucultura cearense explicou que o Ceará, em 1990, criou e desenvolveu – por meio da Embrapa Agroindústria Tropical, sediada em Fortaleza – o cajueiro anão, “o que nos levou ao que pode ser chamado de cajucultura 1.0”.
Eles explicam, didaticamente: “Tínhamos a tecnologia do caju anão precoce, com produção e produtividade três vezes maiores do que os da árvore antiga. Foi uma festa, mas paramos aí. Do outro lado do Atlântico e bem mais além, na Ásia, governos e empresários inteligentes investiram na cajucultura, usando a mesma tecnologia do cajueiro anão. Hoje, os asiáticos Vietnã, Camboja e Índia e os africanos Costa do Marfim, Burkina Faso, Nigéria e as duas Guinés já estão na cajucultura 4.0, e hoje eles dominam o mercado mundial de castanha de caju.”
A Costa do Marfim produz safra anual de 1 milhão de toneladas de castanha de caju; o Camboja, 700 mil toneladas, boa parte das quais é enviada para o vizinho Vietnã que a exporta para a Europa, os EUA e a Índia, que está entre os três maiores produtores, importadores e exportadores mundiais da amêndoa.
“Hoje, na verdade, sem estar nem na lista dos 10 maiores produtores e exportadores do mundo, o Brasil, para alguns importadores estrangeiros, é desconhecido como produtor e exportador de castanha de caju. Veja a que ponto chegamos!”, lamentam os executivos.
Como será possível recolocar a cajucultura cearense no trilho da boa e crescente produção?
Eles respondem, dizendo que algumas indústrias beneficiadoras já prestam assistência técnica diretamente aos produtores e fornecedores, utilizando agrônomos que transmitem ensinamentos de como cuidar do solo, como fazer corretamente a poda, o roço, a aradagem e o tratamento dos resíduos, despertando-lhes para os cuidados ambientais, entre elas a de evitar queimadas a todo custo.
Os executivos citaram uma grande empresa industrial cearense, beneficiadora de castanha, que produz sua própria amêndoa em área de 12 mil hectares, com produção de 1,2 toneladas por hectare, destinando 70% dela para o mercado externo e 30% para o interno. Essa mesma empresa – que usa defensivos orgânicos nas suas áreas de produção – dispõe de um viveiro próprio no qual são plantadas e cultivadas 40 mil mudas/ano do cajueiro anão, com apenas 5% de perdas.
Na sua opinião, se o governo estadual “chegar junto”, garantindo pelo menos a assistência técnica e a produção de mudas para os produtores empresarialmente organizados, “será grande a chance de retomarmos a produção de 30 anos atrás”. Por enquanto, enquanto o governo não chega, “vamos remando contra a maré do pessimismo, garantindo pelo menos a produção de hoje, que gira em torno de 80 mil toneladas de cascatanha de caju”.
Coluna Opinião \ Egídio Serpa \DN
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