Alerta é resultado da análise realizada pelo Laboratório de Microbiologia da Universidade Federal do Ceará, encomendada pelo Diário do Nordeste e realizada com 12 marcas comercializadas em Fortaleza

Queijo coalho é um produto lácteo genuinamente nordestino e representa a cultura, história e gastronomia da região há mais de 400 anos. Entretanto, é preciso verificar procedência, validade e certificação na hora de adquirir o produto.

A pesquisa encomendada pelo Diário do Nordeste ao Laboratório de Microbiologia de Alimentos da Universidade Federal do Ceará (UFC) constatou que 50% das amostras analisadas – comercializadas em feiras, mercados, pequenos comércios e supermercados de Fortaleza – estão impróprias para consumo. São elas das marcas e/ou procedência Lebom (indústria, fabricado no Pará) e os artesanais produzidos por pequenos produtores do Vale do Jaguaribe e de Iracema; os das duas feiras não têm origem identificada.

O estudo foi solicitado em agosto passado para que os pesquisadores testassem o queijo para presença de Salmonella, Listeria, Staphylococcus e Coliformes. A aquisição das amostras, em pacotes de 500 gramas, foi de forma aleatória, levando em conta marcas mais comercializadas nas lojas e bancas.

Da amostragem de 12 diferentes marcas, seis não estavam de acordo com os padrões microbiológicos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Das seis, cinco são queijos artesanais. A boa notícia, aponta a gerente do laboratório e professora do Departamento de Engenharia de Alimentos, Evânia Altina de Figueiredo, é que todos deram negativo para Salmonella e Listeria, tipos mais perigosos. Mesmo assim, o resultado indica que é necessário maior controle das boas práticas de produção e rigor na fiscalização.

Padrões

Na avaliação da pesquisadora, as empresas, sejam artesanais, da agricultura familiar ou indústrias, que produzem esses queijos, devem verificar seus padrões de higiene desde a ordenha. “A contaminação pode ter ocorrido com o leite ainda in natura ou durante o processamento, por meio da água – que precisa ser tratada – além da lavagem dos equipamentos, utensílios, manipuladores, do ambiente de produção, durante etapa de acondicionamento ou ainda da embalagem. Tudo isso pode ter contribuído para o contágio”.

As seis amostras, explica, não atenderam aos critérios sanitários em relação aos coliformes fecais, bactérias que podem sobreviver dentro ou fora do intestino humano e a Staphylococcus que vive na pele e nas vias aéreas superiores. Segundo a pesquisadora, o resultado assinala que o alimento pode ter tido contato direto ou indireto com fezes ou que o leite pode já ter vindo com o staphilo ou durante o processo de manipulação desde a hora de coletar o leite. “Apesar da contaminação ser baixa, é preciso que esses produtores e empresas se adequem às normas e obedeçam às regras de higiene”, orienta Evânia Altina de Figueiredo.

A Associação dos Produtores de Leite e Queijo do Vale do Jaguaribe, incluindo os municípios de Jaguaribe e Iracema, a Queijaribe, reconhece que a contaminação pode acontecer durante qualquer ciclo da fabricação. Em parceria com o Sebrae, realiza cursos de capacitação e um trabalho com objetivo de conscientizar e qualificar os pequenos e médios produtores do Vale. Dos 65 associados, de dez municípios, apenas cinco conseguiram certificação. Um deles, o Jaguaribe, apresentou problema. “A gente vai desde a comida do rebanho, passando por todas os estágios até o queijo pronto e como armazená-lo de forma adequada”, diz um dos integrantes da diretoria, Antônio Carlos de Freitas.

Em relação ao resultado da análise laboratorial da UFC, a Associação dos Permissionários do Mercado São Sebastião informa que cada um é responsável pelo produto que vende. A Associação dos Supermercados do Estado (Acesu) explica, via um de seus diretores, Engel Rocha, que todo produto lácteo comercializado na rede tem o selo de inspeção Estadual ou Federal.

“Quando acontece um problema, o lote é retirado das prateleiras e devolvido à indústria”, garante. O gerente do Raimundos dos Queijos, Adriano Veras, salienta que há mais de 20 anos está com os mesmos fornecedores e nunca teve problemas. Ele diz que, antes de fechar acordo, visitou todos eles e suas propriedades. A Indústria Lebom não respondeu à reportagem até o fechamento da edição.

Herança que perpassa por gerações

A produção artesanal de queijo destaca-se como uma importante atividade para a geração de renda de agricultores familiares em diversas regiões do Ceará. Um dos mais renomados do Vale do Jaguaribe é Francisco Nogueira Neto, conhecido como Neto do Brum. Ele está na atividade desde que nasceu, há quase 60 anos. Seu pai o ensinou tudo o que sabe sobre o assunto. Lições que ele já transmite aos seus filhos, como uma herança. A tradição vem de seus bisavôs, passando de geração em geração há 100 anos.

A fabricação é feita por toda a família e por outros colaboradores que são remunerados. Tem trabalhadores com Brum há mais de 12 anos. O queijo produzido no sítio é totalmente artesanal, com leite cru, mas não quer dizer que seja de baixa qualidade. “A gente realiza dois cozimentos, o que nos oferece mais segurança e qualidade de nosso produto”, afirma.

Brum sabe que a matéria-prima primordial do coalho é o leite e garantir a boa procedência é fundamental para o produto final. “Fazemos análise diária do leite e fora do meu sítio, só compro de duas pessoas de confiança”, informa.

No Ceará, de acordo com o mais recente Censo Agropecuário, existem 100 mil produtores de leite. No entanto, segundo a Associação dos Produtores de Leite do Estado (Aprolece), 90% são pequenos, com uma produção de menos de 50 litros por dia. “Sendo que 75% disso são comercializados e outros 25% destinados para consumo das famílias”, explica o vice-presidente da entidade, Geraldo Magela Frota.

A preocupação com a securidade do alimento é pauta constante da associação. “É preciso acompanhar desde a comida da vaca, com dieta balanceada, saúde veterinária, com vacinação em dia, até as formas corretas de ordenha, refrigeração, manipuladores e do produto pronto e bem armazenado”, salienta o produtor.

Geraldo avalia que houve uma melhora acentuada na excelência do queijo coalho produzido no Ceará. “Temos um longo caminho. A maioria precisa de capacitação, acesso a novas técnicas e conscientização de que é parte de uma cadeia importante”, analisa.

Fonte: Diário do Nordeste

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