Método da Universidade da Pensilvânia almeja transformar dejetos em biomassa comestível, graças a reações microbianas, para viabilizar alimentação em longas missões espaciais.

um conceito um pouco estranho”, reconhece Christopher House, professor de Geociências na Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos.

Sua equipe desenvolveu um método para decompor urina e excremento humanos para criar alimentos para… os próprios humanos.

A técnica consiste em quebrar as partículas de resíduos líquidos e sólidos e, com a ajuda de reações microbianas, transformá-los em comida.

O projeto é parte de uma iniciativa financiada pela Nasa (a agência espacial americana) para encontrar formas mais eficazes de alimentar astronautas em missões que possam se estender por meses ou anos – como, por exemplo, uma possível viagem a Marte.

Isso porque o transporte de alimentos para essas viagens ocuparia espaço de armazenamento em excesso, aumentando o peso da espaçonave, a necessidade de combustível e gerando um complicador extra para as missões.

Até agora, a Nasa já havia desenvolvido algumas alternativas, como a agricultura hidropônica (de cultivo sem solo) ou com luz artificial. Mas tudo isso requer espaço físico para o cultivo.

Ao mesmo tempo, é preciso dar destinação aos excrementos dos astronautas em missões espaciais. Atualmente, os tripulantes da Estação Espacial Internacional reciclam parte da água de sua urina, mas isso exige um grande consumo de energia, diz House. As fezes, por sua vez, são ejetadas ao espaço.

 Processo é semelhante ao do Marmite, um extrato de levedura  (Foto: iStock) Processo é semelhante ao do Marmite, um extrato de levedura  (Foto: iStock)

Processo é semelhante ao do Marmite, um extrato de levedura (Foto: iStock)

House acredita que sua pesquisa pode ajudar na solução dos dois problemas.

“Testamos o conceito de simultaneamente tratar os resíduos dos astronautas com micróbios, (para) produzir uma biomassa comestível direta ou indiretamente, dependendo das preocupações com a segurança (alimentar)”, diz o pesquisador em um comunicado divulgado por sua universidade.

Como funciona?

A tecnologia, explicada em estudo no periódico especializado Life Sciences in Space Research, usa um cilindro de 1,2 metro de altura e 10 cm de diâmetro, no qual determinados micro-organismos entram em contato com os dejetos humanos e os decompõem mediante digestão anaeróbica (processo de decomposição de material orgânico por bactérias, sem oxigênio).

É um processo similar ao empregado pelo nosso corpo para digerir comida – e também usado em estações de tratamento de esgoto.

“A digestão anaeróbica é uma forma eficiente de tratar e reciclar massa (orgânica)”, explica House. “A novidade do nosso trabalho é tirar os nutrientes desse fluxo e intencionalmente colocá-los em um reator microbiano para cultivar comida.”

Uma bactéria-chave nesse processo é a Methylococcus capsulatus, que os cientistas descobriram ter a capacidade de produzir uma biomassa nutritiva que pode se tornar fonte de alimento para astronautas em longas missões.

O conceito é semelhante ao usado para produzir a pasta britânica Marmite, um extrato de levedura que é subproduto da fabricação de cerveja. Em geral, os britânicos se dividem quanto ao sabor: há quem ame essa pasta grossa e escura e há quem não queira nem chegar perto.

 Pesquisa da Universidade da Pensilvânia almeja facilitar a alimentação em missões de longa duração  (Foto: Getty Images)

Pesquisa da Universidade da Pensilvânia almeja facilitar a alimentação em missões de longa duração (Foto: Getty Images)

Segurança alimentar

Mas, se tratando de excremento humano, como garantir que uma biomassa derivada dele não esteja contaminada com patógenos nocivos à saúde?

A equipe de House buscou formas de cultivar micróbios em ambientes alcalinos ou de altas temperaturas para impedir a proliferação de doenças.

E nesses processos os cientistas descobriram mais duas bactérias – Halomas desiderata e Thermus aquaticus – que se desenvolviam bem e que também contêm boas quantidades de nutrientes.

Segundo o estudo, foi possível eliminar entre 49% e 59% dos excrementos em 13 horas de testes.

“Isso é muito mais rápido do que os atuais sistemas de tratamento de resíduos, que levam diversos dias”, diz comunicado da Universidade da Pensilvânia.

Esse método, porém, não está disponível para aplicação imediata. “Esse estudo inicial analisou vários componentes isolados e não um sistema plenamente integrado.”

Mas, segundo House, é um processo que tem potencial de utilização em missões espaciais futuras.

“É mais rápido do que cultivar tomates ou batatas”, afirma o cientista.

“Imagine se conseguirmos ajustar nosso sistema de modo que 85% (dos gases liberados na decomposição) de dejetos fossem usados para produzir proteína, sem a necessidade de agricultura hidropônica ou luz artificial. Seria um avanço fantástico para viagens espaciais.”

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