O partido costumava colocar muita gente na rua. Há dois anos, por exemplo, marchava contra Bolsonaro enchendo a avenida Paulista
No último final de semana, o PT passou o que talvez seja o maior fiasco da sigla nas ruas desde sua fundação. Após a manifestação convocada por Jair Bolsonaro na avenida Paulista, a esquerda quis promover uma reação e colocar gente na rua. Não conseguiu.
O partido costumava colocar muita gente na rua. Há dois anos, por exemplo, marchava contra Bolsonaro enchendo a avenida Paulista. A direita, desde o impeachment, tem colocado mais gente. O PT coloca mais movimentos organizados. Mas agora o PT não coloca ninguém.
No largo São Francisco, em São Paulo, estavam nomes importantíssimos, como José Genoíno. Não foram capazes de juntar duas mil pessoas. Em Salvador, um dos principais redutos do partido, teve discurso da presidente da sigla, Gleisi Hoffmann. Havia pouco mais de 800 pessoas, um fiasco. Aliás, o governador Jerônimo Rodrigues e Jaques Wagner, anunciados para o evento, não apareceram.
Nem na época em que dona Marisa costurava estrela na bandeira o PT era tão “petit comité”. Chegava a ser triste olhar a meia dúzia de gatos pingados batucando desolada enquanto via a manifestação flopar.
Lula fez uma escolha arriscada quando decidiu não descer do palanque e incendiar a polarização. Como Bolsonaro, fala só para o próprio cercadinho. Há, no entanto, uma diferença grande. As pautas do cercadinho bolsonarista, sobretudo na área de costumes, são majoritárias.
Ao falar em defesa da família, contra os bandidos, contra as drogas, contra o aborto e contra a ideologia de gênero, Bolsonaro mirava no cercadinho. No entanto, acertava a maioria da população.
Lula mira no cercadinho dele ao falar do companheiro Putin, relativizar a ditadura de Maduro e vocalizar antissemitismo com a desculpa de comentar o conflito em Gaza. Quadros como Janja e Anielle Franco falam para o cercadinho do identitarismo. Essas pautas funcionam como kriptonita política. Quanto mais se investe nelas, mais fraco fica o político.
O tom das falas também é importante. Hoje fazem sucesso os políticos que falam absurdos e num tom alto. Muitos ficaram poderosíssimos no Legislativo. Bolsonaro foi eleito exatamente por falar os absurdos que falava. Mas, logo depois, houve rejeição a isso. No Poder Executivo, o comportamento belicoso e errático fica muito pesado para a opinião pública.
Imagine o quanto pesa para Lula, que foi eleito justamente para fazer o oposto. Lula prometeu unir o Brasil e restaurar a racionalidade no debate político. Além de apostar pesado na polarização, está fazendo declarações tão bizarras quanto seu antecessor. Quem acreditou na promessa da pacificação se sente traído.
Todo esse processo já fez com que o PT perdesse de lavada a guerra das redes, onde ainda tenta reverter as coisas. Mas agora ficou claro que já perdeu as ruas, algo bastante significativo para um partido que nasce nelas. Ainda não sabemos exatamente as consequências, mas elas virão.
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