Criada em 2007, no Cariri, única região do País a contar com a tecnologia, a cisterna batizada como “Chapéu do Padre Cícero” tem custo de instalação 40% menor do que a convencional e consegue armazenar mais água
“Hoje é uma maravilha! Quanto mais eu trabalhar, mais eu ganho. Dá mais que o aposento”, conta alegre a agricultora Ana da Silva, de 65 anos, moradora do Assentamento 10 de Abril, no Crato. A mudança de vida no Semiárido passa por uma coisa fundamental: acesso à água. Com ela, a vegetação seca se torna verde rapidamente, os legumes brotam do chão, e os trajetos longos a pé atrás do recurso hídrico ficam no passado.
No caso de dona Ana, mais que isso. Como uma das fundadoras da Feira Agroecológica do Município, a água virou sinônimo de autonomia. Se a vida dela se transformou a partir de 2003, quando começou a comercializar seus produtos orgânicos no Centro do Crato, a renda melhorou mais ainda com a chegada da Cisterna Chapéu do Padre Cícero, 12 anos depois, com capacidade para armazenar até 52 mil litros. Apesar de ser certificada pela Fundação Banco do Brasil, em 2013, esta tecnologia ainda é pouco difundida no Nordeste e se restringe à região do Cariri, onde foi criada, pela Associação Cristã de Base (ACB).
No início dos anos 2000, a Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA) desenvolveu o programa Um Milhão de Cisternas, a ser implantado em todo o Nordeste. Na época, a ideia era atender a uma necessidade básica da população: água para o consumo humano. Com isso, foi criada a cisterna de 16 mil litros para captar água da chuva pelo telhado. Em 2007, surge o Programa Uma Terra, Duas Águas, com objetivo de implementar a cisterna maior, com capacidade para armazenar 52 mil litros, voltada para produção. Os modelos mais instalados são de calçadão retangular e de enxurrada, que ainda hoje são construídos.
A ACB, organização não-governamental fundada há quase 37 anos por agricultores de diversos municípios do Cariri, foi uma das primeiras a implementar as cisternas na Região pelos dois programas. Porém, seus técnicos enxergavam um problema, sobretudo, na cisterna de calçadão: a tecnologia consumia muito espaço do terreno dos pequenos agricultores, aproximadamente 200 metros quadrados de cimento, onde a água da chuva é jorrada. Foi aí que seus membros se debruçaram em procurar uma solução.
Em 2007, teve início as primeiras experiências para criar uma cisterna com calçadão circular em que a água que atingisse seu teto também fosse captada, possuindo a mesma capacidade de estocamento: 52 mil litros. Com 80 m² de área, que escorre para as fendas nas bordas, surge a tecnologia batizada de Chapéu do Padre Cícero, pelo seu formato. “Até para homenagear o Padre que incentivava a construção de uma cisterna em cada casa”, conta Socorro Silva, coordenadora da ACB.
A primeira cisterna foi construída no Sítio Catolé, em Nova Olinda, em 2010, para atender à Casa de Farinha Dona Soledade, da Associação dos Pequenos Produtores Rurais do Sítio Serra do Catolé, que fica no topo da Chapada do Araripe. O reservatório teve bom resultado e, ainda hoje, permanece em pleno funcionamento, auxiliando a produção de farinha e goma dos agricultores familiares.
“Nas duas primeiras semanas, percebemos a eficiência da cisterna”, lembra o agricultor José Valdo Gonçalves. “Ela economiza chão e recebe mais água por causa do telhado. Para quem tem uma tarefa, faz uma diferença medonha”, completa.
A Cisterna Chapéu do Padre Cícero também causa um impacto ambiental menor no terreno em que é instalado, já que a de calçadão retangular demanda a retirada de árvores de grande e médio portes do seu entorno. Essa medida é necessária para que as raízes não danifiquem a estrutura, podendo causar rachaduras e afundamentos.
Além disso, o custo da tecnologia criada no Cariri é cerca de 40% menor que a convencional, custando cerca de R$ 6 mil, pois utiliza menos material. “A mão de obra também é mais barata, pois gasta menos dias de construção”, diz o técnico agrícola Ery Cláudio.
Fonte: Diário do Nordeste